Há livros infantis tão significativos que muitas vezes tocam tanto as crianças quanto os adultos, inclusive, em alguns momentos, me pergunto até se a obra não foi criada mais para as mães do que para seus filhos. Mamãe Zangada, da genial Jutta Bauer, é um livro que traz consigo muitas reflexões deste tipo. É um livro lindo, emocionante, que também funciona como um tremendo soco no estômago de mães que passam um pouco da cota no quesito bronca com seus filhotes.
Até eu tive medo ao ver essa imagem |
É claro que todos nós, pais e mães, temos nossos momentos de stress, onde passamos um pouco, ou muito, do limite. Bauer, traz uma reflexão de como a falta de gentileza e trato deixa ferídas e, se tratando da relação entre mães e filhos, como sua consequência bilateral: ao ferir um, a dor se dá nos dois.
Nesse clima um tanto de tensão, mas com abordagem delicada e desprovida de julgamentos, linguagem e aquarelas muito lindas, a autora dá uma lição de civilidade, mostrando como o perdão e o amor são capazes de solucionar qualquer problema. Ela demostra que, quando se trata das mães, somos capazes de qualquer coisa para cuidar de nossos filho e, através da força que emana dos laços de afeto e do amor é sempre possível reconstruir os laços e a nós mesmos, depois das crises.
Entre suas inúmeras interpretações, acredito que Mamãe Zangada, deixa uma mensagem de que as mães, mesmo sendo maravilhosas, poderosas, carinhosas e gentis, também têm o direito de se aborrecer quando as coisas saem do controle, uma vez que faz parte do exercício do amor a convivência, e esta apresentará inúmeras vezes situações de conflito que precisam ser apaziguadas. Claro que existem muitas mães que exageram e vivem sempre aos berros com suas crias. Ao ler este livro podem se sentir muito desconfortáveis, ou talvez confortadas porque no final da obra tudo acaba bem. Mas, afinal, até onde é saudável esse tipo de reação para as crianças? Em minha opinião, é preciso ponderar e perder o eixo o mínimo possível.
Uma vez ouvi uma frase que tento empregar toda vez que sinto que vou perder o controle: o grito existe quando nossas palavras perdem a força. Então, minha gente, vamos exercitar a dialética e o poder da argumentação. Fora isso, nunca ouvi falar de instabilidade emocional seja saudável para ninguém. Como quase todo ser humano, temos nossos momentos menos fofos, mas é preciso refletir como tantas vezes machucam quem amamos e vice-versa, e como poderia ter sido bem menos desgastante se optássemos por uma alternativa menos agressiva.
Aqui em Casa
O resgate dos fragmentos do pinguinzinho |
Hoje Sabrina gosta do livro, mas não muito. Só leio para ela quando me mede para escolher um livro. Algumas vezes, quando o trago, ela reclama. Diz que fica triste com a história. E assim, infelizmente, apesar da beleza, qualidade editorial, inúmeras indicações e premiações que a obra recebeu, Bauer não seduziu minha filha. Quando o ganhou, no início do ano, simplesmente o detestava. Pode ser que seu pânico venha do fato de ver um pinguim desmantelado.
Normalmente este é um dos livros que gosto de ler para ela dormir nos dias que está muito sapeca e que passou dos limites e minha tolerância está a ponto de acabar. Depois da leitura dessa história temos uns papos muito legais, ela me diz como se sente quando fica chatada e como acha que me sinto quando estou chateada, também converso sobre o que me deixa magoada e como me preocupo e precisamos cuidar uma da outra para sermos felizes. Às vezes não resolve (ela realmente é muito sapeca), mas quase sempre ficamos em uma situação de muita troca de carinho, beijos e abraços, até ela pegar no sono.
Minhas impressões
Jutta Bauer, com suas aquarelas mágicas, escrita simples, poética e cheia de poderes mágicos, nos dá uma lição de como solucionar qualquer problema entre pais e filhos: é preciso amor, limite, cuidado e humildade. Sim, é preciso que nós, pais e mães, respeitemos as crianças e peçamos desculpas quando exageramos. Faz-se necessário principalmente deixar claro o que nos levou a tomarmos certas atitudes, fortalecendo o diálogo e a relação de confiança e carinho, para que esta nunca deixe de existir.
Também não posso deixar de ressaltar que é um livro que me ajudou bastante. Passei a refletir muito mais na forma como converso com ela quando estou chateada. Seria uma grande hipocrisia não falar que ao ler este livro, senti um nó no coração. Engoli seco e me senti péssima porque visualizei a fragmentação e a dor que causei em minha filha a cada vez que perdi o equilíbrio e dei uma "chamada" daquelas... Quando li pela primeira vez com ela, ela chorou com pena do pinguim. Foi muito lindo. Por sorte ela não se projetou. Mas ao vê-la inconsolável, abracei e acabei chorando também, agradecendo por ela não me ver como aquela Mamãe Zangada, ufa!!!!
Tenho que admitir: demorei um pouco para ter coragem de escrever sobre este livro. Mas era preciso desabafar, ter coragem de admitir que de vez em quando erramos, mas estamos dispostos a evoluir. É incontestável não concluir, depois de lê-lo, que a mãe que souber trabalhar bem o diálogo ao invés do grito poupará muito seus filhos e a si mesma.